Na abertura do seminário “Construindo Ações para Mato Grosso Livre da Hanseníase”, o presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT), conselheiro Sérgio Ricardo, anunciou que as estatísticas sobre a doença serão incluídas como ponto de controle na análise das contas anuais de governo dos municípios a partir do ano que vem. O encontro reúne mais de 350 gestores e profissionais de saúde de 103 municípios de Mato Grosso e de outros estados, no auditório da Escola Superior de Contas do TCE-MT.
“O Tribunal de Contas está discutindo hoje um dos assuntos que não discutia no passado, mas nós mudamos, nós discutimos os problemas do estado de Mato Grosso, nós discutimos políticas de estado para que qualquer governo que venha saiba os problemas que ele tem que enfrentar. Eu não conheço ninguém com hanseníase porque as pessoas têm vergonha, é uma doença que exclui as pessoas, faz mal fisicamente e mentalmente. Mudaram até o nome, mas é a lepra. Temos uma situação gravíssima e não tem cabimento não sabermos quantas pessoas têm hanseníase em Mato Grosso”, declarou o presidente.
Sendo assim, para traçar um raio x da doença no estado, com um diagnóstico preciso para embasar as estratégias de combate, Sérgio Ricardo definiu que todos os gestores deverão prestar contas ao TCE-MT da situação da hanseníase no seu município. “Vamos estabelecer um ponto de controle para que todos apresentem quantas pessoas têm hanseníase no seu município e qual a política de saúde que estão desenvolvendo. O gestor terá que escrever, porque vamos analisar esse relatório. Se não acompanharmos esses números, não adianta.”
O conselheiro-presidente também apontou a contradição que desafia a riqueza do estado. “Somos campeões na produção de soja, milho, algodão e carne, com recordes nas exportações de commodities, e somos também os campeões na hanseníase. Estamos 60% acima da média nacional, Mato Grosso detém a maior taxa de detecção de hanseníase do país, com quase 4 mil casos registrados em 2024, mas agora vamos descobrir onde está essa doença, em quais municípios e o motivo dela ainda existir em nosso estado. Vamos trazer isso à tona.”
Presidente da Comissão Permanente de Saúde, Previdência e Assistência Social do TCE-MT e coordenador do seminário, o conselheiro Guilherme Antonio Maluf salientou a importância de unir esforços para que as ações sejam efetivas. “Queremos levantar os problemas para que todos os atores possam construir soluções e essas soluções têm que ser construídas de cima para baixo para que possam acontecer. Tenho certeza de que esse encontro será lembrado como o pontapé das ações para que possamos tirar Mato Grosso dessa posição.”
Segundo o presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), Edilson de Sousa, todas as cortes de contas do país devem seguir o exemplo do TCE-MT. “É importante conhecermos os problemas e juntos encontrarmos soluções, para tirarmos não só Mato Grosso, mas também o Brasil dessa posição vergonhosa. O objetivo é cuidar da vida dos cidadãos relegados ao esquecimento, precisamos devolver a dignidade por meio da cura e a Atricon se coloca à disposição para dialogar com o Ministério da Saúde e todos os envolvidos para alcançarmos esse objetivo.”
A diretora-geral da Escola Superior da Magistratura (Esmagis), desembargadora Helena Maria Bezerra Ramos, reforçou que o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) está à disposição para dar continuidade ao trabalho iniciado pelo TCE. “O remédio é barato e é distribuído pelo Sistema Único de Saúde (SUS) por isso é fundamental que as prefeituras estejam engajadas na busca desses pacientes, que muitas vezes não sabem que estão contaminados. Aí está a importância de as equipes dos municípios fazerem os levantamentos para que seja feito um controle e um acompanhamento desses pacientes.”
No mesmo sentido se pronunciou o secretário-geral do Ministério Público de Mato Grosso (MPMT), procurador de Justiça Adriano Augusto Streicher de Souza, ao ressaltar que a mobilização faz parte da missão constitucional das instituições de garantir acesso à saúde pública. “Os dados evidenciam o quanto é oportuna a realização desse seminário. O combate não é só uma questão de saúde pública, mas de dignidade. Embora tenha tratamento, a hanseníase ainda causa danos a milhares de mato-grossenses. Apesar do pacto da saúde de 2006 envolvendo Governos Federal, Estadual e Municipal ainda há falhas que devem ser corrigidas e esse encontro vem ao encontro disso.”
Já o presidente da Comissão de Saúde, Previdência e Assistência Social da Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT), deputado estadual doutor João, adiantou propostas que o Legislativo adotará. “Vamos promover debates no Legislativo para que o tema seja colocado em evidência para combater o estigma, fomentar propagandas sobre prevenção, diagnóstico e tratamento, promover diálogo com os municípios para que se possa ter um acompanhamento do avanço da doença e, sobretudo, proporcionar uma parceria institucional entre as comissões de saúde da Assembleia e do Tribunal de Contas.”
Por sua vez, o secretário estadual de saúde, Juliano Silva Melo, destacou os desafios operacionais para a rede de saúde e as consequências geradas pelas doenças negligenciadas. “Existe uma dificuldade em levar a informação aos profissionais na ponta e aos cidadãos. Os profissionais, principalmente da rede primária, são da mais alta importância nesse processo, assim como a conscientização. Esse processo educacional de promoção do autocuidado é fundamental e esses momentos de discussão podem tirar esse estigma.”
Para o representante da Defensoria Pública da União (DPU), Renan Souto Maior, a atuação do TCE-MT será fundamental para o avanço de políticas públicas mais efetivas. “Precisamos de mais pesquisas e, se o estado é o que tem o maior número de contágios, temos que estar na ponta. Precisamos utilizar todos os recursos para que tenhamos efetividade na garantia do direito à saúde e à dignidade das pessoas contaminadas e que sofrem com todos os efeitos da doença.”
Também compuseram o dispositivo de honra da abertura os conselheiros Antonio Joaquim e Valter Albano, o procurador-geral de Contas, Alisson Carvalho de Alencar, o juiz Agamenon Alcântara Moreno Júnior, o superintendente do Ministério da Saúde em Mato Grosso, Altir Peruzzo, o secretário-adjunto da Administração Penitenciária, Jean Carlos Gonçalves, o diretor do Instituto de Desenvolvimento e Apoio a Gestão, Nésio Fernandes de Medeiros Junior, o presidente do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Mato Grosso, Flávio Alexandre dos Santos, e o presidente da Sociedade Brasileira de Hansenologia, Marco Andrey Cipriani Frade.