A ansiedade já é a terceira causa que mais afasta o brasileiro do trabalho. Segundo levantamento do Ministério da Previdência Social, de outubro de 2023 a setembro de 2024, o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) concedeu 128.905 benefícios por incapacidade, antigo auxílio-doença, por “outros transtornos ansiosos”. Essa denominação inclui, por exemplo, ansiedade generalizada e transtorno de pânico.
A doença ficou atrás apenas de dor nas costas (dorsalgia), com 185.843 requerimentos concedidos, e de outros transtornos de discos intervertebrais, com 150.066.
Em 2021, a ansiedade estava em 10º lugar no ranking, respondendo por 49.481 afastamentos. No ano seguinte subiu para oitavo, com 54.203. Em 2023, esse número chegou ao quinto lugar (80.516).
O levantamento considera somente aqueles afastamentos por mais de 15 dias e que, consequentemente, geraram um benefício ao segurado do INSS. O trabalhador pode ter a estabilidade de 12 meses no emprego, após alta médica, se a causa da doença estiver vinculada ao trabalho.
Os transtornos mentais estão cada vez mais ocupando as principais causas que afastam do trabalho. O chamado episódios depressivos foi responsável por 49.582 licenças médicas em 2021. No ano seguinte esse número subiu para 50.027. Em 2023 chegou a 67.966 e agora está atingiu 102.883 pedidos concedidos.
Também fazem parte do ranking o transtorno depressivo recorrente, distúrbio de saúde mental que se caracteriza por episódios depressivos repetidos, e transtorno afetivo bipolar (TAB), alteração mental que se caracteriza por mudanças extremas de humor.
“Chat GBT, plataformas e mercado de trabalho dominado por algorítimos fazem com que o ambiente de trabalho fique cada vez mais incerto, que o trabalhador se sinta inseguro, que cada vez mais as metas sejam abusivas. E tudo isso faz com que as pessoas adoeçam”, afirma Lariane R. Del Vechio, advogada especialista em acidente e doenças do trabalho.
Para ela, o aumento dos casos de transtornos mentais ocorre pela influência da nova estrutura do mercado de trabalho, por esse excesso de informação e de tecnologia e pela falta ao direito de desconexão e descanso.
Hoje, nós temos um grande problema de desconexão, que é esse trabalhador que fica o tempo inteiro à disposição no celular, à disposição no computador, e faz com que também tenha crise de ansiedade, depressão, estresse e síndrome de burnout.
(Lariane R. Del Vechio)
O Brasil é o país com mais pessoas ansiosas no mundo, segundo a médica do trabalho e psiquiatra Leticia Maria Akel Mameri Trés, membro da Comissão de Saúde Mental e Trabalho da Anamat (Associação Nacional de Medicina do Trabalho).
Ela explica que isso se reflete nos ambientes corporativos. E entre os fatores que podem agravar o problema no trabalho estão:
Jornadas de trabalho longas e exaustivas
Metas agressivas
Falta de reconhecimento
Alta pressão no ambiente de trabalho
Ambientes não saudáveis
Comunicação ineficaz
Falta de apoio da parte de chefias e colegas
Assédio psicológico ou sexual
A ansiedade se torna incapacitante quando interfere significativamente nas atividades diárias e no desempenho no trabalho.
(Leticia Maria Akel Mameri Trés)
Já o advogado Washington Barbosa, CEO do WB Cursos, acredita que estamos vivendo uma epidemia de transtornos mentais no trabalho.
“Dados indicam que a grande doença do século é a depressão e as doenças psicológicas. Ansiedade está diretamente ligada a isso. Nós temos inclusive até agora burnout que tem crescido muito nas empresas e tido vários impactos, tanto na previdência como no direito do trabalho. É uma crise de saúde pública, eu até diria que é uma pandemia de problemas psicológicos, principalmente, na geração Z, dos anos 2000, que tem sofrido muito com isso”, afirma Barbosa, mestre em direito das relações sociais e trabalhistas.
O advogado defende que a previdência deveria ter um aspecto preventivo. “Não só conceder o benefício, mas, por exemplo, identificar uma situação dessa e, juntamente com o Ministério da Saúde, envolver campanhas, trabalhos e até tratamentos específicos para gerir seu risco. Isso reduziria os custos também”, avalia.
Segundo Barbosa, ainda há muito preconceito em relação a essas doenças, que são as mais difíceis para ter aprovação da perícia.
Há um ledo engano de que essas crises de ansiedade, problemas de depressão e até o próprio burnout sejam imaginações, frescuras, fraquezas, o que não tem absolutamente nada a ver. São doenças sérias que devem ser tratadas com muito cuidado. Quando você chega com os laudos para o médico perito federal, ele pode vir com esse preconceito.
(Washington Barbosa)
Rol de doenças
O rol de doenças que dão direito ao benefício por incapacidade temporária foi atualizado no fim do ano passado, quando o Ministério da Saúde incluiu na Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT) os transtornos mentais.
Desde 1999, o Brasil tem uma lista com 182 doenças profissionais reconhecidas, que, desde 29 de dezembro de 2023, passou a contar com um total de 347 patologias, entre elas burnout, ansiedade, depressão e tentativa de suicídio. A Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho não era atualizada havia 24 anos. Veja a lista aqui.
Atualmente o pedido para o benefício de incapacidade temporária é feito por meio do Atestmed, ferramenta que permite a substituição da perícia médica presencial pela análise documental em casos de auxílios com duração de até 180 dias.
É necessário comprovar a incapacidade para o trabalho por meio da apresentação de atestado médico e documentos complementares.
A documentação médica (atestado, laudo ou relatório médico contendo CID da doença) deverá ser anexada no momento do requerimento do auxílio por incapacidade temporária – análise documental no aplicativo ou site Meu INSS. O pedido também pode ser feito pela Centra 135.
Como pedir o benefício
Entre no Meu INSS
Clique em “Pedir benefício por incapacidade”
Selecione o tipo de perícia e siga as orientações que aparecem na tela
Informe os dados necessários para concluir seu pedido
Documento precisa ter as seguintes informações
Nome completo do requerente;
Estar legível e sem rasuras;
Ter a data de emissão do documento médico, a qual não poderá ser superior a 90 dias da data de entrada do requerimento;
Conter a data de início do repouso e o prazo estimado necessário;
Conter informações sobre a doença ou Classificação Internacional de Doenças – CID;
Ter a assinatura do profissional emitente e carimbo de identificação, com registro do Conselho de Classe – Conselho Regional de Medicina (CRM), Conselho Regional de Odontologia (CRO) ou Registro do Ministério da Saúde (RMS) – que poderão ser eletrônico ou digital, desde que respeitados os parâmetros estabelecidos pela legislação vigente.(R7)